Tenho 39 anos, sou casada e tenho uma filha. Terminei a faculdade de psicologia semestre passado e me empenho em estudar o suficiente para tentar dar conta das muitas histórias que povoam a minha vida profissional e, claro, a minha própria.
Lendo aqui, conversando ali, ouvindo acolá, percebo que tive uma família de origem, muito bacana. Minha mãe principalmente. Mesmo com todas as dificuldades que ela própria como mãe, mulher, ser humano tinha, sempre procurou dar e mostrar o seu melhor. Nem por isso deixou de mostrar o seu lado B, entretanto, percebo hoje que quero ser para a minha filha o que da minha mãe ficou em mim. Como se fosse uma mãe criada/inventada por mim, ou seja, o que restou da minha mãe em mim. A mãe que eu guardo dentro de mim, pode ser, e provavelmente é, diferente da mãe que eu tive na realidade, mas não tem o menor problema, o que importa é que a mãe que tá valendo é essa aqui, que convive comigo 24 horas por dia.
É claro que essa mãe da qual estou falando, só existe dentro de mim, porque tive uma (outra) mãe na dureza do cotidiano que deu a circunferência onde esta pôde se inscrever. A minha mãe, Maria Teresa, foi quem abriu espaço para essa que vive em mim, nascer e prosperar. Sem ela, nada disso seria possível.
Infelizmente, tenho percebido que nem todo mundo pôde, na infância, contar com um mãe como a que eu tive, contar com uma figura que oferecesse respaldo, carinho, bronca, que mostrasse seus defeitos sem grandes problemas, que fosse de carne e osso, e, justamente por ser assim, foi que ela me apresentou uma vida/realidade afetuosa, cambiante, tipo: você está no mundo e o mundo está em você, aproveite. Tenha amigos, fale a verdade mas procure não machucar os outros, tenha compaixão, não seja tão dura nem com você nem com quem te rodeia, fale menos palavrão, vá trabalhar, vá estudar, vá à luta, viva a sua vida, e saiba que eu estou aqui.
Outro dia vivi uma situação bastante angustiante, na qual me deparei com alguém que teve muito pouco desse tipo de mãe, desse tipo de colo, desse suporte psíquico e emocional; uma forma de maternagem que mães desse tipo fazem, independente da idade que o filho tenha. Abre parênteses, esse tipo de mãe sabe que pode atuar dessa maneira porque sabe que o filho já está de posse de sua vida e pode andar com as próprias pernas, ou nadar sem a bóia pois não vai se afogar, devido aos "truques" por ela ofertados.
Trunfos necessários para a vida que se apresenta ao bebê, à criança e ao adolescente. A diferença, ou uma delas, é que o adulto quando se esborracha tem vergonha de mostrar até pra si mesmo que derrapou e a criança chora, caso tenha se machucado ou ficado amedrontada. Porque não pedir colo? Porque não demonstrar que se machucou mesmo sem ter ferida nenhuma para mostrar? Onde foi que aprendemos que nosso infantil tem que ficar escondido no sótão ou no porão? Quem disse? Quando? Porque?
Como eu dizia, faz muito pouco tempo que vivi uma situação onde nitidamente os inconscientes se comunicaram e fui impelida a me utilizar do meu infantil e do da pessoa em questão. Perguntei se poderíamos sentar no chão para que nosso encontro tivesse um campo onde se apoiar e se iniciar. Criança gosta de brincar sentada no chão. E assim foi. Dando vazão a um infantil mastigado e cuspido, mal-tratado e envergonhado, pude me oferecer como um ambiente onde a pessoa em questão se sentiu a vontade para se explorar. Isso está funcionando até agora, e percebo que podemos avançar aos pouquinhos, um passo de cada vez, que nem a criança que aprende a sentar, depois a engatinhar, depois a andar e depois a correr. Mas aprender essas e outras coisas é tão mais prazeroso quando temos alguém nos olhando, né? Onde o adulto se localiza?
Depois que o macaco aprendeu a andar com as duas pernas, deixou pra lá o lado que senta no chão, que se esborracha e levanta sem constrangimento por ter ralado o joelho. Porque comecei falando da minha mãe pra chegar até aqui? Porque com ela pude cair, me esborrachar, choramingar, chorar de me acabar, reclamar, bater porta, escrever bilhete ressentido, carta de amor, cartão de aniversário, de natal, de eu te amo, perder a paciência. Porque ela estava lá. Pra mim, por mim.
Se os adultos pudessem se colocar um dia por ano na pele de uma criança, acho que pensariam duas vezes antes de se aventurarem por caminhos nada esclarecedores aos pequenos, caminhos que confundem, que não acalentam, que não transmitem o que se vê nem o que se sente. Descaminhos. Acorda mundo ou vocês pensam que nosso futuro está nas mãos dos E.Ts?!!!! Que tipo de gente vocês estão pensando em deixar aqui depois que nós morrermos?
Levem à sério as brincadeiras das crianças, e quando puderem, participem, não há creme rejuvenecedor mais eficiente, não há remédio contra a osteoporose mais eficaz!
bjs
ap